domingo, 20 de maio de 2012

“Tudo me inspira: sobretudo o nada” entrevista de Affonso Romano de Sant'Anna concedida a Carlos Rosa Moreira.


Concedida ao escritor e acadêmico Carlos Rosa Moreira, a presente entrevista do literato Affonso Romano de Sant’Anna foi originalmente publicada no Literato – O Jornal das Letras de Niterói. Tendo cumprido seu papel de figurar impresso naquele veículo, o texto de entrevista é gentilmente cedido por Carlos Rosa para divulgação virtual no Literatura-Vivência.
Ler um trabalho como este não é um excelente modo de começar a semana?!




“Tudo me inspira: sobretudo o nada” entrevista de Affonso Romano de Sant'Anna concedida a Carlos Rosa Moreira.



O mineiro Affonso Romano de Sant’Anna ensaista cronista, jornalista, professor e um dos maiores  poetas da lingua portuguesa. De forma gentil, concedeu ao Literato (Jornal de Letras de Niterói) a entrevista que se segue. Nestes tempos em que tudo é “arte” desde rabiscos em muros a frases mal articuladas e berradas, seguidas por batidas ou marteladas, levantam-se a voz pausada e os persamentos cristalinos de ARS apontando caminhos em direção à verdadeira arte, jogando luz de uma crítica não agressiva, mais incisive sobre questões importantes de nossa cultura. Para mim, ouvi-lo é alimento. Apenas temo que sua voz seja das últimas, tornando-o quase um transgressor.



Carlos Rosa Moreira: Durante seis anos você dirigu a Bibiblioteca Nacional e fez, entre outros, aquele projeto admirável de criação e increment de bibliotecas por todo o Brasil.Se fosse agora, que projeto gostaria de fazer?

Affonso Romano de Sant'Anna: No livro Ler o mundo (Ed.Global) fiz uma síntese dos projetos realizados. Falar do que falta seria escrever outro livro.

CRM: De que sente falta na Literatura Nacional?

ARS: De críticos (não jornalistas, que façam reportagens). Que os cadernos culturais abram espaço para os brasileiros, que não sejamos meros importadores de best sellers estangeiros.
 
CRM:  Pelo que se vê no atual meio cultural brasileiro, você é um transgressor?

ARS: A palavra “transgressor”, que entrou na moda, já me cansou. Já é possivel fazer um Museu da Transgressão.

CRM: É possivel ser escritor sem se export?

ARS: O escritor se expõe, queira ou não. 

CRM: Qual a responsabilidade de um intelectual em seu meio?

ARS: Cada um sabe de si. Eu sou uma pessoa doente de história e do presente.

CRM: Duchamp se tivesse nascido no Brasil, faria aquele sucesso todo?

ARS: Nem pensar. Ele deu o golpe certo, percebeu que tinha que ir para os EUA terra do kitsch e da novidade

(Nota: Leiam O enigma vazio e Desconstruir Duchamp, livros nos quais ARS analisa Marcel Duchamp, o homem que influenciou a arte do sec.XX ).

CRM: Se estivesse na mesma situação do “Gil”personagem interpretado por Owen Wilson no “Meia noite em Paris”do Wood Allen, com que turma de escritores gostaria de encontrar?

ARS: Em geral, os escritores mitológicos são uma decepção na intimidade, preferia continuar a lê-los, apenas.

CRM: O que gostaria de reler, pelo prazer simples de ler?

ARS: Qualquer coisa. As leituras aleatórias são fecundantes. Dos grafitos nos muros às revistas de consultório.

CRM: Outras artes inspiram você, abrem caminho para a prosa ou a poesia?

ARS: Careço de arte como de uma vitamina imprescindível. Tudo me “ inspira”, sobretudo o “nada”.

CRM: Algum autor influenciou você?

ARS: Todos, inclusive os ruins, que indicam o caminho a não seguir.

CRM: Em que lugar gostaria de recitar uma poesia sua (se é que falta esse lugar)?

ARS: Já falei poesia em grutas, em teatro grego, na cama, no palco, na sala de aula, em igreja, bibliotecas, jardins, deserto, praia. Atualmente falo para dentro.

CRM: Que novidade gostaria de perceber em nossa cultura, Affonso?

ARS: Que a cultura fizesse parte do cardápio trivial do brasileiros.





Divilgação cultural
(clique na imagem para ampliar)


5 comentários:

  1. Dois grandes nomes, hein? Parabéns!
    Belvedere

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  2. Parabéns, Carlos Rosa! O LITERATO começa a ganhar conteúdo quando passa a publicar matérias como esta entrevista. Vá em frente! Att.
    P.R.Cecchetti

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  3. Prezado Roberto,
    muito bem elaborada a entrevista com Affonso Romano de Sant'Anna. Carlos Rosa fez perguntas inteligentes.A última, sobre cultura,teve definitiva resposta:"...que
    ela fizesse parte do cardápio trivial dos brasileiros".
    E do menu sofisticado de muitos deles, acrescento.
    Luiz Calheiros.

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  4. Renato Augusto Farias de Carvalho22 de maio de 2012 às 16:53

    Caro Roberto: definitivamente, computador e eu não nos afinamos. Ontem, remeti para seu blog um comentário s/a entrevista de Carlos Rosa. Tudo muito pensado e muito sincero: não foi, a tela escureceu que nem os céus amazônicos em tardes de chuvaradas... Estou retornando com saudades de todos os amigos. Quanto à entrevista do Carlos Rosa devo dizer, hoje mais rapidamente (tenho N compromissos) : a estética e a vocação literária do Carlos eliminam completamente o banal. O rapaz procura atender, sempre, seu nível de satisfação pessoal e a resposta é sempre correta. Gosto muito de toda a entrevista e sempre releio a obra do Affonso que "ensina" a simplicidade da boa poesia e a curiosidade em talentosas crônicas. Vale muito ler e reler a obra de ambos. Em LER O MUNDO a gente pode interpretar a intenção literária do entrevistado.
    Parabenizo Carlos pelo bom trabalho e você, Roberto, pela iniciativa incansável do seu prestimoso blog. Sincero abraço do Renato Augusto Farias de Carvalho

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  5. Roberto, que tríade de peso em seu Blog!!!

    No centro, o grande Affonso! Desnecessário comentar!

    Ao lado, provocadoras questões do Carlos Rosa, autor de "Ah! Baudelaire" e de " Eugênia", texto ainda em segredo, mas que já deve ser propalado!

    E, para completar o denso TRIO, o convite de sua conferência sobre Umberto Eco!

    Dalma

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