sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Maria Sabina de Albuquerque: Um compêndio




Quem conhece Maria Sabina? Esta pergunta incomoda duplamente. Em primeiro lugar, irrita os leitores que conhecem esta que foi, além de poetisa, jornalista, declamadora, líder feminista, escritora, professora de  oratória, de francês, de inglês, de literatura universal, enfim, uma personalidade de destaque na cena cultural da primeira metade do século XX; por outro lado, provoca os que não a conhecem, pois os confronta com a ignorância do legado literário desta figura (ignorância que, nesse caso, quase constitui um déficit de formação). Entre os dois casos, contudo, julgo que o primeiro incômodo ainda é mais próprio, pois nele se encontra potencialmente mesclado o inconformismo de ver Maria Sabina de Albuquerque com menos reconhecimento do que o merecido, além da vontade saudável de colocá-la no nicho em que ela deveria estar. Que posto seria esse? Ora, precisamente aquele que é destinado a uma diva da cultura e literatura brasileiras (ao lado de Patrícia Rehder Galvão, a Pagu, e Cecília Meireles).
A referida vontade – felizmente – não fica no plano do idealismo. Ela ganha concretude em um trabalho admirável desenvolvido desde 1961 pelo Centro Cultural Maria Sabina (CCMS), espaço dedicado à memória da pessoa e obra da autora. Prova maior desta dedicação é Neide Barros Rêgo, a mais autêntica seguidora de Maria Sabina  e que, com diligência, preside os diversos empreendimentos do referido Centro Cultural.
É também capitaneada por Neide Barros Rêgo uma equipe de pesquisadores que prepara, já há 13 anos, um compêndio que pretende reunir a vasta documentação sobre a vida e obra da autora. Maria Sabina se encontrará, assim, muito bem “mapeada” em uma edição que compilará seus escritos literários, notas biográficas, as muitas notícias históricas veiculadas em jornais de circulação da época e rico material fotográfico que retrata as diversas fases da longa Carreira da autora.
Programado para ser uma volume substancial, os organizadores do Compêndio em homenagem à Maria Sabina, já se encontram na iminência de ter que se haver com pelo menos três alentados tomos, dado à riqueza documental que esta pesquisa de fôlego trouxe como resultado (o mesmo fôlego que emulou outros trabalhos organizados por Neide Barros Rêgo, como por exemplo: a antologia Água escondida, de 1994, e Brazila Esperanta Parnaso, de 2007).
Publicado este compêndio, julgo que todos podemos responder, positivamente, à pergunta com a qual este artigo se inicia, justamente por saber que Maria Sabina, além de uma Biografia é um todo compendiado e, como bem nos diz Hegel, “A verdade está no todo”(!)


Silêncio

                                                                              Maria Sabina de Albuquerque

Silêncio... quanto mais sugeres que a palavra!
Tua eloquência estranha e persuasiva
tem tanta força em sua imprecisão!
Falas melhor de tudo quanto lavra
no recôndito da alma inquieta e viva,
perturbas muito mais o coração

Silêncio... para as almas foste feito:
tudo o que é belo ou mau no nosso peito
fala melhor se tudo se calou...
É no silêncio que melhor se pensa;
no silêncio a saudade se condensa;
sempre em silêncio é que melhor se amou.

O silêncio foi feito para a prece;
é no silêncio que a nossa alma tece
a trama singular das ilusões...
É no silêncio que melhor se chora;
é no silêncio que melhor se adora

e em silêncio se falam os corações...




Divulgação Cultural
(Clique na imagem para ampliar)








terça-feira, 16 de agosto de 2011

Cegueira da palavra – Leitura, literatura e filosofia






Todo o visível é enunciável e é inteiramente
visível porque é inteiramente enunciável
Foucault

Os deuses não morreram: o que morreu foi a
nossa visão deles. Não se foram: deixamos de os ver.
Pessoa



Que o universal só é alcançado no pensamento está dito em todos os liames e meandros onde o lógos posiciona-se hora em vez que conjugado com o mithos, abandonando a pretensão dos épicos gregos da pequenina Atenas reclamada nas viagens translúcidas de Vernant; cabe-nos investigar a ordem dessa afirmação. Talvez aqui falemos de Literatura.
Inspirar formas e propalar imagens descontinuamente proto-históricas é um dos grandes desafios postos na ordem da existência das positividades, nesse espaço onde o método é premissa e o ritmador de existências revela-se Pollock das almas que passam a existir quando do bater de asas do colibri.
Há um saber explicitamente-implícito no cotidiano dos mortais: o cego não vê. Daí constatamos o quanto potencialmente ignorante somos, universalmente débeis estamos e homicidas do belo nos tornamos. Ao dar possibilidade histórica de existência ao texto o autor deve procurar a cegueira das palavras e lembrar que todas têm imagem; desnudá-las de sentidos anteriores sem a ordem onipotencializadora do novo, com a revelação do descontínuo que se encontra em processo de. Mas o cego é que nutre essa possibilidade, pois já está no caminho das imagens livres, vê com as mãos e com os outros sentidos que desenvolve por necessidade e possibilidade/materialidade existencial de ocupar as vias urbanas de vitalidades múltiplas onde a forma é que dita o campo de significados, não a imagem recebida unilateralmente; a visão do cego transforma, a nossa nubla, forma em tomos formas já designadas como verdadeiras. Mas o que é a verdade senão um lapso da investigação poética? Uma possibilidade que quando pensada evapora, que quando vista líquida ilude; o ato de repouso dos olhos a faz gasosa.
A verdade é escrava da razão, a imagem do cego projeta uma outra idéia de espaço-tempo. O cego faz Literatura, recria o criado. Assim como em Deleuze quando da Filosofia, o cego é o inventor de conceitos. Saramago já gritou isso.
Não seria um caminho para você, leitor, buscar a cegueira das imagens, passando a ver o que só é visto inicialmente com as mãos? Talvez esteja aqui um exercício da anatomia das imagens – talvez Literatura – que são designadas por aqueles que não vêem o verde como verde, mas sua essência, a cor que é dita pela pulsão de todas as funções existenciais, distantes de Sartre, deslocando conceitualmente as reflexões de Heidegger e enveredando-se pela imagética criação de Dali por vezes repousada nas geometrizações de Picasso, no todo, desintegradas por Warol.
Possivelmente tal desintegração possa ser vista no enfrentamento da leitura como atividade plural que coloca em xeque a unidade entre autor, obra e leitor; levando também ao questionamento das verdades instituídas por disciplinas como a História e Teoria da Literatura.
Escrever e/ou transcender o espaço-tempo no plano de uma concretude possível abarca os devaneios instaurados pela idéia de limite ou ordem de aparição. Há quem diga que o pensar já é um telos instaurador e as reticências da abstração aportam em um ponto final.
A escrita é uma produção, instauradora de verdades que se percebe como tal quando da busca, daí sua centralidade. Quando situada no plano binário (seria hora de nos dirigirmos para a terceira dimensão ou buscar o alcance da música atonal?) erige autor-leitor, intermediado pela obra. Teriam, os mesmos, existências independentes? Talvez a Literatura não permitisse.
Ler é atribuir significados, ato esse grávido de tradições e interconexões do criado, alguns diriam do existente em qualquer dos mundos possíveis. Perquirindo a idéia de que original é quem plagia primeiro – misto de Platão e Lavoisier operado por Matoso – diríamos que a obra serve ao criador até o momento que não for lida; assim, quando lida, estará de posse do leitor, promiscuindo-se infinitamente nesse processo. Daqui pode ser feito o istmo de verdade, este em processo de solidez ideológica, um dos momentos do reino da História e Teoria da Literatura, gestão efêmera quando conjugadas pelos verbos convencer e seduzir. Diria Silviano: se eu conseguir prender meu leitor até a 30a página de meu livro, conquistei-o. Pois sim, não há representações sólidas sobre as nuvens. A leitura está entranhada no âmbito da cultura, da ressignificação e mostra-se uma contrabandista de significantes e significados.
A obra não é uma via de acesso ao real muitas das vezes instaurado pela ficção? O melhor dos mundos possíveis é esse mundo e a criatura – texto – esvai-se em infinitudes a partir do momento que se faz concebida; iludem-se – leitor e autor – que elas lhes pertencem, e o tempo de apropriação é um istmo ou aquilo que quando pensado deixa de ser (convocando Wenders: a imagem quando vista não é mais).
Pensar em unidade nessa trilogia esquizofrênica da criação é abortar a idéia de linearidade intersubjetivada no caos. O real é composto de ilusões e/ou partículas de angstrons da ilusão. Afinal o que é real e ficção no mundo literário? Que nos ouça Rosa, que nos leia João Cabral e que nos vasculhem Machado! São existências profundamente heterogêneas que conferem graus de simetria e homogeneidade, a leitura faz captá-lo. O belo depende disso pois é simétrico mesmo quando em fractais. O esculpir de Rodin nos fala, mesmo de fora da fractalidade. O caos é uma ordem, ainda desconhecida, mas exibida nas ruas de João do Rio.
Como só vemos o que conhecemos e o traduzimos a partir do que somos, a leitura instaura-se como o sopro do criador (o desafio é identificá-lo, criador) sobre o já criado, em um ritmo espiralado, transmutando-se a cada passo caótico, a cada cognição, a cada ato de empréstimo de existências conferidas por autor e obra no momento de transcendência do leitor.
Talvez o desafio seja ser obra, ser criatura-criante; ser algo que ainda não foi no espaço-tempo. Tanto História quanto Ciência da Literatura não capturam tal movimento, ainda estão na discussão prévia de ditar verdades – porém necessárias – de Copérnico, mas a simbiose de atribuição de significados no plano dos significantes – leitura – já consome Newton e Einstein no plano histórico de Heisenberg.
Os deuses são cegos e a razão é moral. O autor deve ser um asceta de cego, sem a megalomania acidental-obrigatória do discurso cristão que unifica essa cegueira, que funda estatutos de verdade, que conjuga a construção de imagens no singular e faz do plural da palavra a miséria dos fracos, fundando a mais fétida moral. No politeísmo do cotidiano amoral a limitação da experiência é explícita e os que querem o recurso da não-forma amparam-se na experiência trágica da loucura que se mostra como ausência de obra, que sai do campo do batismo de caserna, que faz do campo de visão a bengala da inutilidade verbal.
Sim, o verbo é fundante mas a palavra prenhe de possibilidades está sempre em construção, continuamente descontínua e em profundo flerte com a loucura, fomentando realidades que vários deuses não acessaram – mesmo demiurgos – e que por isso se colocam como ditadores de realidades, criadores de essências que se mostram como odores fétidos de putrefação cintilante, uma negação de Dostoievski. Não é humano o ato de categorização da palavra, os homens quando homens são, necessariamente – também –, discurso de palavras que ainda não se foram, mas gestadas/geradas/geridas/geladas no ato mesmo do pensamento; aquele que descortina o discurso no universo de mudez da criação, viabiliza a condição histórica de possibilidades e esteriliza tudo o que há de nocivo à saúde do autor, esse integrante do Olimpo da beleza, hóspede do habitat do traço/treco/trança/troco/tripa/trôpego; perfilado aleatoriamente no espaço infinito que se mostra finito aos olhos contaminados pelas certezas do mundo fácil, lá aonde o homem perde seu principal instrumento diferenciador da fauna terráquea: a palavra. Ela é um fractal e produzida sob sons, esses só ouvidos pelos desprendidos. Aqui a rima é lixo e o não-visto é luxo, luxúria. Literatura?
O discurso da loucura tornou-se adjetivo da démarche histórica do universo da arte. Do Rosário, Gogh, Claudel e outros não formatados aqui se fazem presentes. A arte liberta de toda (?) referência de dominação quando pensada como transgressão do óbvio, nesse universo a Literatura integra/entrega o suspiro dos vivos. A Literatura dá voz ao louco, este cria e transgride o real dos empedernidos de normalidade. Não pode! Não pode! Não pode mostrar-se confortador e/ou conformado com os deuses da escrita - que não morreram, sabemos. Os deuses realmente mostram sua força quando tornam-se profundamente desnecessários. Delicioso desafio: saborear o fel lendo os papéis preenchidos por Nise, numa simbiose de Psicologia, Literatura e Filosofia, emanadora da música.
Não enxergar. É esse o imperativo categórico dos que fazem gritar a liberdade, dos que percorrem letras buscando a disparidade da razão. Desrazoar a razão é o exercício primeiro da criação, desarvorando/mostrando seus limites e expressando sua crise no oceano de sensibilidade ativa/hermenêutica quando em relação com o pensamento, pois onde a palavra naufraga o texto navega e a razão desintegra. Somos minúsculos na captação.
Procurar a heterogeneidade nos leva ao encontro da homogeneidade e faz-nos perder a produção em série quando alcançado o que fora busca. É tão bela a idéia da busca pela busca, mas o mundo de mercadorias-neon só permite que busquemos o que já foi devidamente colocado como de objetivo claro, não vê que o nome das coisas não é as coisas. Assim, talvez, a Literatura leia Aristóteles e seja nutrida por Baudelaire.
Não pode haver objetividade sem a caracterização explícita do processo subjetivo. O concreto é posterior ao abstrato e exige da imaterialidade polissêmica o quadro que ainda não foi, mas está tomando forma a cada grão de realidade que repousa em seu texto, a cada letra que perfila o espaço em branco de Gates. Onde estão os guardiões de idéias que não entram nessa busca pela cegueira? Ora, para pensar abstratamente é necessário um corpo, pois nosso compromisso deve ser sempre com o pensamento; por mais que ele esteja limitado pela razão que é falha/folha/fosca, mas contém uma forte disciplina interna de lançar-se ao concreto, contaminando-se de materialidade, dando palavra ao texto, tirando-o do enclausuramento das luzes que a tudo vê e nada capta, só representa o óbvio da transgressão no plano da representação, em muito, da verdade, essa desprezível instauradora de normas.
A essência do texto é ser um conjunto de palavras vivas, tentando ir além da démarche dos neologismos, buscando os orvalhos de significados das transliterações dos irmãos Campos, estes que – junto com Pignatari – fizeram da estética das palavras um grito-alto-mudo das artes urbanas: concretismo; onde a palavra grita a libertação do cárcere, sem memórias, estado bruto. Talvez verdade literária.
O conhecimento produz conhecimento. Sim à redundância difícil que se mostra superficialmente fácil. Enganemos os adoradores de deuses que os vêem sob a ótica da necessidade, que fazem do perdão a figura fácil do sorriso sem espaços com um imperativo que se mostra combustível dos apolíneos: transgressão. Adorar a alguém é fazer-se escravo do fútil, há algo mais desprezível? Quando servo da cegueira abra os olhos. Sê Zaratustra.
O espaço da palavra é o próprio espaço do texto-organismo e o tecido orgânico das idéias é o próprio corpo tornado fundador do logos. Nada, nada estabelece limites tão rígidos à liberdade de um texto quanto à absoluta falta de palavra, a absoluta falta de idéias, a morte do pensamento e a megalomania da reflexão. Literalizar a realidade talvez seja o seu recriar.
Um texto mostra-se fundante, quando, também, cega o local enquanto índice do global, respeita o movimento incessante das partículas que compõem a semântica, pluraliza a etimologia e percebe as infinitas possibilidades de aparição da polissemia. Enganou-se quem disse (diz?) que só a ciência produz conhecimento, se assim o for somos todos cientistas na acepção iluminista da palavra. Será que em todo o planeta há a conjugação que ser é ser em si estendendo-se ao outro? Quem determina abruptamente os campos semânticos deve percorrer a escrita de Caetano nas neo-imagens dos sons de Campos com as devidas aliterações e paronomásias (peias dos pés presos... pretas)? O texto é uma poesia do impreciso, terrivelmente precisa, que nos maravilha e nos agride na sordidez coiseante (a coisa coiseia, ou as coisas coisificam, não nos diz Heidegger?) das imagens, compactadora das angústias e das incertezas humanas, expulsando a doença das palavras, aquela fragmentadora de pulsões; valendo-se da habilidade do autor que não privilegia tal dimensão factual, como essência, mas pensá-la em sua realidade e expô-la. Que nos valham os límpidos sons das idéias de Roberto Machado musicalizados por duas notas: descontinuidade e saber.
O texto é um simples acidente cuja realidade individual não deve prejudicar a ordem essencial da palavra, fá-la brotar do impossível, conhecendo. Conhecer a palavra é revelar seus sintomas, o que está mais próximo de sua natureza. Ora, o que mostra o estudo da palavra – fusão terminal da Filosofia e Literatura – mostra o espaço da percepção a tal ponto um espaço lingüístico que não há uma diferença fundamental entre ver e dizer. Aqui o liame-limite da cegueira, onde todos os sentidos tornam-se desnecessários por não haver privilegiamento do momento mesmo da captação da idéia, fundando o espaço para realização do texto.
É a aproximação da estrutura lógica do leitor que permite à história das palavras sorver um de seus objetivos fundamentais: a nomeação do visível em comunicação com o invisível. Pela estrutura o visto torna-se dito e o cego aparece como um mestre em transcendência; aqui o que se chama de estrutura está permeado por uma experiência temporal, ainda não percebida, mas os apressados já a querem definir, dizendo o que está, negligenciando o que não está. Guiar-se pela facilidade para quê? Até hoje não sabemos em qual inseto metamorfoseou-se Gregor; a pressa determinou a barata...
Quem cria cuida e queda pelo quântico dos dissimulados. Um não aos meros reprodutores, os mesmos de linearidade burra que matam qualquer possibilidade do coro das Bacantes. Não queira fazer-se eunuco do desejo, grite o insano de Munch e carnalize a imagem com Bacon, deixando-a em pendência, nublando o que está claro: crise.
Para que haja signo uma idéia deve representar outra e, ao mesmo tempo, nela deve estar manifestada essa representação. Mas os signos copulam com o tempo e a poligamia autoral faz crescer internamente o mundo dos cegos e dos que lutam para sê-lo, para sorver a seiva da selva dos servos do politeísmo autoral. Só é original quem se faz ouvinte e perde a visão quando do ato da escrita ou mesmo desdiz o dito no campo branco de celulose. Talvez haja aqui Literatura.
Toda morte tem positividade. Não queremos positivismo, mas recuperar (?) o que nunca se perdera na base dos cegos: burla da imagem! Optemos por morrer na suposta totalidade, não deixando marca/possibilidade de vida. O vínculo se mostra independentemente de nossa limitada vontade do distanciar-se. Ar que compõe a atmosfera que nem todas as narinas estão aptas a imiscuir-se, promiscuir-se, aludir-se, evadir-se. O evasivo de Woody não é a marca de sua genialidade? A não-captação do quadro já pintado e a eleição do outro no mesmo contexto do sempre não é o nutriente das lentes de Godard? A câmera não segue o pulso das pálpebras no percurso traçado pelos jovens da Nouvelle Vague? A imagem contextual em movimento não é o imperativo categórico do velho no Cinema Novo ou nos nórdicos do Dogma? Morte, sim, morte sempre. Ela condição de possibilidade de vida, que no sagrado encontra-se em aberto, dessacralizado. Faz-se Severina, morte e vida.
O cansaço é natural quando a análise mostra-se iceberg, correndo um sério risco da cegueira nunca chegar e a nossa música nunca mais tocar. Não, não distinguimos por critérios de objetividade, pois ela, só, é burra; não faz em nenhum momento, só se deixa fazer, unilateralmente. Ao lixo os critérios de objetividade, mas só depois de compreendidos e milimetricamente sorvidos. Assim, a intersubjetividade é explicitada na intertextualidade. O caminho de nós mesmos são os outros, devemos vê-los como cegos que cerceiam a facilidade da imagem, que jogam a palavra no abismo das possibilidades, transgridem o linear, buscam o caos...