sábado, 5 de maio de 2012

Projeto "Livros que marcaram Niterói" ("O homem fluminense", de Vera de Vives)



Convicto do brocardo lobatiano segundo o qual “um país se faz com homens e livros”, tentei elencar, de memória, aqueles títulos que eu acreditava representar bem a cultura literária de Niterói. Consultando várias pessoas ligadas ao meio acadêmico de minha cidade, foi curioso o fato de minha lista coincidir com os títulos apontados por aqueles conhecedores de livros. Diante desta coincidência (ou deveria dizer “feliz serendipidade”), animei-me, sem maiores pretensões, a apresentar quinzenalmente alguns dos livros que teriam, de algum modo, marcado a cena literária niteroiense. Livros que trouxeram contribuições substanciais em alguma área, inovações, resgates, celebrações de datas festivas da cidade e que, até, ficaram conhecidos pelas polêmicas que causaram. Em todos esses casos, o valor literário ou histórico foi o que deu o critério para essas escolhas que – longe de serem completas – serão singelos afagos na cultura de nossa cidade.


Em cada quinzena, o leitor de Literatura-Vivência poderá conhecer, no Projeto “Livros que marcaram Niterói”, um pouco mais das nossas letras.
 
 
O homem fluminense, de Vera de Vives
 
 



Aos conhecedores da literatura especializada sobre o Rio de Janeiro parece ser patente a importância e excelência que a tetralogia de Alberto Ribeiro Lamego possui. Obra reconhecida e, ainda hoje, estudada com significativo proveito, O homem e a Serra, O homem e a Guanabara, O homem e o Brejo e O homem e a Restinga constituem um competente trabalho que envolve a geografia física, a demografia, a etnologia e a geologia de nosso estado (quanto a este último item, impressiona o autor dissertar até sobre a granulação dos compostos rochosos presentes nos penedos de nossas serras!).
A atenção ainda hoje voltada para estas obras foi, sem dúvida, a responsável pela tímida visitação que se faz a outros títulos que enfocam, da mesma forma, aspectos significativos de nosso Rio de Janeiro. Entre estes: O homem fluminense.
Editado em regime de cooperação pela Fundação Estadual de Museus do Estado do Rio de Janeiro e pelo Museu de Artes e Tradições Populares, no ano de 1977, a obra foi idealizado por Elton Medeiros, embora toda a pesquisa de campo e redação tenha ficado a cargo da jornalista e escritora Vera de Vives.[1] Produzido pela já referida Fundação, tendo como seu presidente Leonídio Ribeiro Filho, o trabalho é fruto de uma pesquisa etnológica que pretendia registrar traços da vida rural: moradia/arquitetura, as técnicas da lavoura, a pesca e seus ambientes (rios, banhados e lagoas), os gêneros agrícolas cultivados, os utensílios, a culinária típica; a arte material, renda de bilros, os santeiros e escultores de madeira, os artífices de instrumentos musicais, a cerâmica manual etc; a arte imaterial (nomeada pela autora “arte espiritual fluminense”), o caxambu e o jongo, boi pintadinho e jaguará, folias de reis e do Divino, a Carvalhada, as festas de Paraty e Saquarema etc...
Com metodologia bem fixada e adequadas técnicas de pesquisa de campo, o trabalho que deu origem a O homem fluminense possuía uma única justificativa: a de que era necessário documentar a cultura fluminense diante do risco de sua descaracterização ante o inevitável avanço da cultura de massa. Também um único objetivo: preservar as memórias de nosso estado. E, por fim, uma generosa oferta: “O homem fluminense é uma homenagem a elas (as memórias do estado), pela tenacidade com que souberam preservar suas raízes e tradições”. (p.3)
A elaboração dos sete capítulos que compõem esta obra de mais de cem páginas exigiu da equipe envolvida no projeto longas viagens por 23 municípios fluminenses. Luís Antônio Pimentel (que colaborou como fotógrafo no livro), em depoimento exclusivo ao Blog Literatura-Vivência, narra um pouco dessa aventura: “Eram verdadeiras incursões ao coração do estado. Havia horas em que andávamos léguas debaixo de sol e comendo a poeira naquelas estradas de chão. Era um grande alento quando podíamos nos abandonar nos bancos da kombi que vinha nos buscar. Mas ninguém da equipe reclamava, estávamos todos cansados mas muito satisfeitos com o que fazíamos. Só a Vera parecia não cansar!”. Além de Pimentel, trabalharam na documentação fotográfica Jorge Sirito Vives (marido de Vera de Vives), Zalmir Gonçalves, Gilson Barreto e Roberto Costa de Sá Peixoto. Estes fizeram com que O homem fluminense se tornasse um documento ricamente ilustrado com requintes de detalhes.
Entre as três mencionadas divisões do livro, a que certamente parece melhor documentada é aquela que trata da “Arte espiritual fluminense”. Os folguedos são minuciosamente descritos ali por meio da prosa límpida e objetiva de Vera de Vives. Esta parte ainda traz as letras e as partituras das músicas que embalam àquelas manifestações culturais. Destaquem-se, neste momento, as peças do mineiro-pau de Santo Antônio de Pádua, a folia de reis de Duas Barras e a “Benção da farinha”, oriunda da folia do Divino de Saquarema. Desta última, pedimos licença para reproduzir, aqui, sua singeleza: 

“São José, Santa Maria
− Jesus, Maria
Puxando a sua bestinha
− Jesus, Maria, protegei...
Jesus, Maria.”
(p. 92) 

Embora na época de seu lançamento a obra tenha recebido uma ampla tiragem, todos estes anos sem uma nova reedição faz com que exemplares de O homem fluminense sejam mais frequentemente encontrados em bibliotecas públicas e em estabelecimentos de ensino (proporcionalmente, são poucos os exemplares pertencentes a particulares). Ainda que esta falta seja insuficiente para considerar O homem fluminense um livro raro, estamos convictos de que: por sua louvável iniciativa, sua elaboração acurada e sua caprichosa acolhida, a Obra já nasceu sobre a reputação de “raro livro”.


[1] Vera de Vives foi membro da AcademiaNiteroiense de Letras – ANL e durante década assinou uma coluna chamada “Diário sem data”, no jornal O Fluminense. Entusiasmada defensora da causa fluminensista, escreveu um romance dedicado à lenda cantagalense do Mão de Luva, a obra se chama Descobertas e extravios (Record, 1997).
 

sexta-feira, 4 de maio de 2012

"Ah, Baudelaire...", conto de Carlos Rosa Moreira



Quem seriam os atuais "atores" da literatura fluminense?
Esta pergunta tem por resposta uma série de nomes que, entre os nativos das terras do estado do Rio de Janeiro e os nela radicados, compõem um caldo literário com o tempero bem ao nosso gosto.
As postagens que se seguirão nesta semana, a contar de hoje, vêm esboçar (ou ainda, ilustrar) as respostas à referida questão. Apresentaremos alguns dos escritores que compõem o significativo cenário da literatura fluminense (sejam eles vivos-atuantes ou pertencentes a um passado ainda muito vigente). Consideremos homenageados os nomes aqui contemplados; estejamos, pois, preparados para o que é reconhecido como o melhor e o mais louvável na literatura feita no Rio de Janeiro.



   The big nudes II, (foto de Helmut Newton), Modelo: Kylie Bax


Ah, Baudelaire...                                      
           
                                                                                                                       Carlos Rosa Moreira


“Il faut être toujours ivre, de vin, de poésie ou de vertu... à votre guise”

É isso que você diz há gerações, meu caro; sim, você diz, com o verbo assim mesmo, no presente. E diz mais: diz que mais embriagadora é a poesia, a única capaz de levar o homem ao delírio.
Ah, Baudelaire... Se você conhecesse os olhos de Carmem Lúcia... São poesia pura! São capazes de arrebatar o sujeito virtuoso e enlevá-lo e levá-lo ao mais psicodélico e prazeroso dos delírios, mais do que o melhor vinho pode provocar. Os olhos de Carmem Lúcia... Eles têm uma coisa por trás que atiça a gente. É como se dissessem: ─ Se vier tem, mas é difícil chegar, meu chapa! 
E dizem isso sem agressividade, docemente. São olhos poderosos e doces, isso é que são. Ainda por cima, ocultam uma fragilidadezinha, uma luz que parece pedir proteção. Ah, Baudelaire... Dá uma vontade de pegar!
Acho que já não são muitas as Carmens Lúcia. Estavam em moda nos anos 50 e 60, mas depois se extinguiram. Acredito que todas as Carmens Lúcia têm mais de 40 anos. Essa, a dos olhos, tem quarenta e pouquinhos. Mas que exuberância... Está no auge! Se botar photoshop estraga, tiraria toda a expressão, tudo o que aprendeu em sua vida de mulher, o que a faz mais bonita. Naquelas bem traçadas e quase imperceptíveis linhas desenhadas pelo tempo, veem-se as dores, os prazeres, as tristezas e as alegrias, todas as vibrações que perpassaram sua alma feminina e construíram uma beleza personalíssima.
 Mas não é qualquer um, meu amigo, que vê e sente a poesia. É preciso ser generoso, ter a alma livre e o coração aberto, é preciso ser um pouco poeta. A poesia da qual você fala, esse láudano que pega a gente e conduz ao êxtase, essa poesia que está nas coisas e é poesia sem poema, não é para todos. Só uns felizardos a reconhecem. Meus olhos vertem lágrimas, meu caro Charles, quando percebo a poesia. E a percebo tanto! Mesmo os insensíveis percebem a poesia, embora não saibam disso. E quando sabem não consideram sua própria sensibilidade, repudiam-na.
A poesia está em tantos lugares, coisas, situações... Na chegada de cada estação do ano, numa pintura, num drible com a bola, no sopro carinhoso do vento sobre o mar, nas curvas aéreas e cimentadas do Niemeyer, em algo encantador que nos faz parar a correria em pleno centro da cidade só para contemplar, e sonhar. Existe tanta coisa, não Baudelaire? Você, então, sabe tudo! Só não sabe dos olhos de Carmem Lúcia... E eles virariam sua cabeça e o deixariam bobo e arrebatado como o sujeito cheio de vinho e virtude. Hoje eu desejei viajar delirante nos olhos de Carmem Lúcia. Mas ela teve de ir embora. Então procurei um boteco e tentei me embriagar, mas não deu, eu já estava embriagado. Foi a poesia...






Diversidade na programação de maio da Biblioteca Pública de Niterói - BPN


Este mês, a Biblioteca Pública de Niterói oferece um agendacultural variada, com atividades gratuitas:


Palestra sobre Ecologia Humana (Crédito: Cristiana Seixas)


02 de maio (quarta)
Movimento
15h
Atividade de valorização da cultura popular, com diversos grupos trabalhandocantigas de roda e brincadeiras.

03 de maio (quinta)
Roda de leitura – De conto em conto se chega à África
14h30
Realizada em parceria com o Ponto de Cultura Gingas - Casa da Cultura Afro-Brasileira, a atividade apresenta contos africanos procurando preservar amemória e as tradições culturais de origens africanas. Inscrições na BPN oupelo email: inscricao.gingas@gmail.com. Vagas limitadas!
Poesia no barbante
15h
Atividade que estimula o gosto pela escrita e o interesse pela poesia. A criança tem a possibilidade de se expressar em diversas linguagens: textos, desenhos, poemas, versos e prosas.

04 de maio (sexta)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

08 de maio (terça)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.
Roda de leitura – Literatura Fantástica
14h30
Realizada em parceria com o Ponto de Cultura Gingas - Casa da CulturaAfro-Brasileira, a oficina consiste em quatro encontros quinzenais dedicados à leitura temática, inicialmente de prosa curta, com contos e crônicas de Literatura Fantástica. Inscrições na BPN ou pelo email: inscricao.gingas@gmail.com. Vagas limitadas!
10 de maio (quinta)
Roda de leitura – De conto em conto se chega à África
14h30
Realizada em parceria com o Ponto de Cultura Gingas - Casa da Cultura Afro-Brasileira, a atividade apresenta contos africanos procurando preservar amemória e as tradições culturais de origens africanas. Inscrições na BPN oupelo email: inscricao.gingas@gmail.com.Vagas limitadas!
Poesia no barbante
15h
Atividade que estimula o gosto pela escrita e o interesse pela poesia. Acriança tem a possibilidade de se expressar em diversas linguagens: textos,desenhos, poemas, versos e prosas.

Lançamento de Livro – Revivência
17h
De autoria de Irinéia Pereira Gomes, Revivência retrata experiênciase momentos marcantes de uma época caracterizada por músicas, amizades e amoresromânticos.  Versos poéticos de grande sensibilidade e emoção.
11 de maio (sexta)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

15 de maio (terça)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

Roda de leitura – Encontro com a obra de Clarice Lispector
14:30
Realizada em parceria com o Ponto de Cultura Gingas - Casa da CulturaAfro-Brasileira, a oficina consiste em quatro encontros quinzenais dedicados àapresentação da obra de Clarice Lispector por meio de contos, crônicas, trechosde romance e entrevistas. Inscrições na BPN ou pelo email: inscricao.gingas@gmail.com. Vagaslimitadas!

16 de maio (quarta)
Movimento
15 h
Atividade de valorização da cultura popular, com diversos grupos trabalhandocantigas de roda e brincadeiras.

Palestra sobre Ecologia Humana
18h
A psicóloga e biblioterapeuta Cristiana Seixas ministrará palestra sobre asrelações do homem com o meio.
17 de maio (quinta)
Roda de leitura – De conto em conto se chega à África
14:30
Realizada em parceria com o Ponto de Cultura Gingas - Casa da Cultura Afro-Brasileira, a atividade apresenta contos africanos procurando preservar amemória e as tradições culturais de origens africanas. Inscrições na BPN oupelo email: inscricao.gingas@gmail.com. Vagas limitadas!
Poesia no barbante
15 h
Atividade que estimula o gosto pela escrita e o interesse pela poesia. Acriança tem a possibilidade de se expressar em diversas linguagens: textos, desenhos, poemas, versos e prosas.
18 de maio (sexta)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

19 de maio (sábado)
Atividades de Cultura Afro-Brasileira na BPN
10h
O Ponto de Cultura Casa da Cultura Gingas encerra as oficinas oferecidas naBiblioteca Pública de Niterói - BPN com um dia des atividades em homenagem àCultura Afro Brasileira.

22 de maio (terça)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.


Dois Monólogos Entrelaçados
18h
Leitura dramatizada de trechos do livro “Ângela e Antônio”, de MariaHelena Latini.

24 de maio (quinta)
Poesia no barbante
15h
Atividade que estimula o gosto pela escrita e o interesse pela poesia. Acriança tem a possibilidade de se expressar em diversas linguagens: textos,desenhos, poemas, versos e prosas.

25 de maio (sexta)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

26 de maio (sábado)
Dois Monólogos Entrelaçados
17h
Leitura dramatizada de trechos do livro “Ângela e Antônio”, de MariaHelena Latini.

29 de maio (terça)
Era uma vez na BPN
11h / 15h
Contação de história (leitura e interpretação) de livros do acervo da Ludoteca.
Atividade realizada todas as terças e sextas-feiras,  às 11h e às 15h.

31 de maio (quinta) Poesia no barbante
15h
Atividade que estimula o gosto pela escrita e o interesse pela poesia. Acriança tem a possibilidade de se expressar em diversas linguagens: textos,desenhos, poemas, versos e prosas.

Visitas guiadas: A Biblioteca Pública de Niterói recebe grupospreviamente agendados.
Os agendamentos podem ser feitos pelos telefones: 3601-1956 / 3601- 2034
Horários: De terça a sexta – das 10h às 20h
Sábados e domingos - das 10h às 19h

Outras informações:
Praça da República, s/nº
Centro – Niterói
Tel.: (21) 3601 1956 / 3601 2034

faleconosco@bibliotecaniteroi.rj.gov.br

quinta-feira, 3 de maio de 2012

"O poema e a rosa", por José Eustáquio Cardoso


Alguém ainda acredita na velha e boa poesia, na antiga cantiga de melodia grafada em métrica, ritmo e rimas? Nos versos que se recitavam em rodas, saraus e salões e figuravam entre as pouco mais que elementares lições dos livros da matéria então chamada Linguagem, remontando à nostalgia dos primeiros bancos escolares?
Alguém ainda acha que o sentimento da poesia, assim como o sentimento do homem, tão antigo como ele próprio e como sua própria cantiga, deve passar pela compreensão de sua linguagem, imagens e símbolos, para não se constituir em indecifráveis enigmas, apenas alcançáveis por iniciados? Que a poesia, mais que lida e interpretada, deve ser tocada, apalpada e ouvida para correr por veias e chegar aos corações?

 

Capa do livro Canção Antiga 

O autor desta Cantiga Antiga, sim, ainda acredita, acreditando até que essa forma de poesia pode ser resgatada ou, quando menos, ainda apreciada, no
mínimo por aqueles que se comovem com canções, as quais até hoje ainda se valem das rimas como companheira inseparável da melodia. A melodia canta em versos, e os versos cantam melodia, eis a profissão de fé do poeta, apaixonado por música, irmã siamesa da poesia, ao ponto de estar seguro de que a união de ambas constitua o mais feliz conúbio de que se tem notícia. Será que alguém duvida?
E por isso ainda faz e lê versos como quem canta ou "como quem aprende uma dorde outros versos aprendida" ou "como quem acende uma outra dor" que ele aprendeu "da vida". E o resultado é esta partitura de poemas urdidos "como não tão antigamente" se escreviam. Poemas com uma pauta em cada estrofe, um compasso em cada ritmo, uma nota em cada sílaba, um acorde em cada rima, uma
frase melódica em cada verso, a canção como síntese. Poemas mais que com rimas e ritmos, versos e melodias, com alma e coração.
O autor desta Cantiga Antiga, sim, ainda acredita, acreditando até que essa forma de poesia pode ser resgatada ou, quando menos, ainda apreciada, no mínimo por aqueles que se comovem com canções, as quais até hoje ainda se valem das rimas como companheira inseparável da melodia. A melodia canta em versos, e os versos cantam melodia, eis a profissão de fé do poeta, apaixonado por música, irmã siamesa da poesia, ao ponto de estar seguro de que a união de ambas constitua o mais feliz conúbio de que se tem notícia. Será que alguém duvida?
E por isso ainda faz e lê versos como quem canta ou "como quem aprende uma dor de outros versos aprendida" ou "como quem acende uma outra dor" que ele aprendeu "da vida". E o resultado é esta partitura de poemas urdidos "como não tão antigamente" se escreviam. Poemas com uma pauta em cada estrofe, um compasso em cada ritmo, uma nota em cada sílaba, um acorde em cada rima, uma
frase melódica em cada verso, a canção como síntese. Poemas mais que com rimas e ritmos, versos e melodias, com alma e coração.
Deixem-se, pois, de lado sofisticadas operações de inteligência para se aferir a intenção do poeta: com alma e coração tendo sido escrita, com coração e alma é que se deve ler e ouvir esta Cantiga Antiga.Deixem-se, pois, de lado sofisticadas operações de inteligência para se aferir
a intenção do poeta: com alma e coração tendo sido escrita, com coração e alma é que se deve ler e ouvir esta Cantiga Antiga.



O poema e a rosa


                                                                                              José Eustáquio Cardoso


Eu leio versos como quem aprende
uma dor de outros versos aprendida
e faço versos como quem acende
uma outra dor que eu aprendi da vida.

E de uns e de outros versos me recende
um traço ou resto de fragrância havida
em uma e outra dor e se compreende
em pét’la de entre espinhos recolhida.

Dor de versos é dor que não me dói
mais que a dor de não ter versos que ler
mais a dor de não ter dor que aprender.

Suave me nasce, vive e se constrói
da substância sublime e preciosa
de sangue rubro a colorir a rosa.

Itajubá, 28/12/2008



"Manifesto dos poetas" (em defesa da cultura e da renascença da literatura fluminense)




Afresco com o brasão do estado do Rio de Janeiro



                                                                                                     Roberto S. Kahlmeyer-Mertens
                                                                                                                Luiz Augusto Erthal


“Tem tantas belezas, tantas,
A minha terra natal,
Que nem as sonha um poeta.
E nem as canta um mortal!”

“Minha Terra”, de Casimiro de Abreu,
em As Primaveras


Às margens de rios nasceram as civilizações seculares: Babilônia, em meio às terras nutridas pelo Tigre e Eufrates; o Egito nas planícies inundáveis do Nilo; a China às várzeas férteis do rio Amarelo. Que outro terreno – senão o fluminense – seria mais seminal para o renascimento da literatura de nosso estado?
Noventa e duas urbes reunidas em torno da pulsação de um peito apenas, o mesmo número de celeiros de cultura a terem suas portas abertas e seus valores postos novamente à vista do céu fluminense – a cúpula sob a qual viceja uma terra livre de preconceitos. Formamos, por assim dizer, um território sem interiores. Pertencemos a um só compartimento, que, parafraseando Euclydes da Cunha, nada mais é do que a base física da nossa regionalidade.
Da camisa aberta o peito, fluminenses de vários quadrantes escreveram as mais belas páginas da nacionalidade. De Campos, a brava terra goitacá, veio Patrocínio romper os grilhões da escravidão; de Niterói, histórica capital e ainda hoje referência cultural de nossa sociedade, Benjamin Constant partiu para assumir a paternidade da República, tendo como arauto Silva Jardim, fluminense de Capivari; Alberto Torres, de Itaboraí, Euclydes da Cunha, de Cantagalo, e Oliveira Viana, de Saquarema, formariam uma tríade sem a qual não haveria o sentimento de brasilidade conforme o sabemos hoje.
Nos campos de batalha, nossos soldados – Caxias à frente – sustentaram a altivez do pavilhão auriverde. O mesmo pavilhão tremula ao lado da bandeira alvianil por todo o território fluminense, mas de modo ainda mais dramático em certas fortificações do lado niteroiense da Baía da Guanabara, que registram uma singularidade reveladora do nosso sentimento pátrio: somos talvez o único estado que aponta os seus canhões contra o próprio peito.
Subi o Imbuhy, o São Luís e o Santa Cruz e vereis suas bocas de fogo viradas para a barra tanto quanto apontadas contra nós, dispostas a nos imolar em defesa da mais brasileira de todas as cidades, o Rio de Janeiro, a capital que defendemos como bastião naturalmente erguido ao seu redor. Foi assim na Revolta da Armada, de onde Niterói emergiu, sob escombros, após meses de canhoneiro incansável, como Cidade Invicta.
Resgatamo-nos, assim, da apatia que reinou após deixarmos de ter a capital do Brasil em nosso seio. Sabemos hoje que Capital sempre foi a urgência de nos apropriarmos de nossa identidade e estima, e da nobre cultura que nos banha.
Recordemos o Rio de Janeiro enquanto firme, materno, imenso e sagrado sítio desde o qual um resgate dos melhores bens nos permitirá, novamente, com propriedade, dizer: “Nunca mais, nunca mais nesta terra/Virão cetros mostrar falsos brilhos./Neste solo que encantos encerra/Livre pátria terão nossos filhos.”*
Falsos brilhos serão, doravante, todos aqueles que interferirem em nosso destino de regressar às raízes e tradições; os verdadeiros – confessamos desde já – sempre foram os acolhidos como cultura material: indústria, artesanato, arquitetura e culinária típica; imaterial, nossos costumes, nossos folguedos, nossa arte, nossa mitologia e, sobretudo, nossa literatura.
Se veraz então a língua dos poetas, saibamos que é a palavra que reúne, agrupa, congrega; que foi um verbo de grandeza que, na origem, uniu, em comunidade, fluminenses do litoral e do interior. Comungar com esta “comum-unidade” é o que faz de uma província, Nação.
O lógos literário, apontador de nosso locus mais autêntico é, então, acalentado por nós como brisa de renovação: uma cultura renasce, uma identidade renasce, o homem fluminense é o que renasce da utopia romântica.
Do mesmo modo que o Velho Mundo viu sua Renascença, também nós buscamos reler, reeleger e nos religar com genuínos laços às raízes.
Assim como a Europa de Dürer e Alberti recorreu à sua ancestralidade, também nós evocamos nossos deuses-lares. – Vinde vós então fantásticos Euclydes da Cunha, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela, Júlio Salusse, Alberto de Oliveira, Carlos de Laet, José Cândido de Carvalho, Luiz Leitão e todos aqueles cuja palavra viçosa nos faz lembrar de nós mesmos como filhos deste mundo e terra.
Libertos, hoje, da velha missão estratégico-militar, podemos, enfim, voltar as sentinelas da alma aos nossos próprios valores, encontrados em versos da mais rica lira. A capital cujo perímetro importa-nos defender agora é a cultura fluminense, terra fértil de poetas, prosadores, pensadores e demais sonhadores libertários.
É imperativo que todos aqueles que se julgam fiéis portadores da palavra-literária em terras fluminenses se ponham sob o Beta do Cruzeiro do Sul, universalidade apenas possível na singularidade de seu torrão próprio. Tomemos posse de uma herança espiritual nascida da boa e velha cordialidade fluminense; da brisa inspiradora que sopra por entre praias, rios, lagunas, planícies, florestas e os altos píncaros de nossas serranias.
Voltemos, pois, as baterias contra tudo aquilo que tem conspurcado a pureza dessa identidade singular; o sentimento de pertencimento a tudo quanto é belo, heróico e galante na trajetória desse flúmen sublime. Alistemo-nos a esta trincheira e ergamos, uníssonos, uma ode de louvor à cultura fluminense.
Apenas ante as palavras que nos narram é que nos pertencemos.


* Trecho do Hino XV de Novembro,hino oficial do estado do Rio de Janeiro, letra de Antônio José Soares de Sousa Júnior






Divulgação Cultural
(Clique na imagem para ampliar)

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Literacia - Revista Literária Internacional (Novo Número)






Colunistas

Adelto Gonçalves: Cartas a um jovem escritor

Affonso Romano de Sant'Anna: INDO À COLOMBIA

Alexei Bueno: STÉPHANE MALLARMÉ

Álvaro Alves de Faria: Ministra continua desaparecida

Antonio Ozai: O sofrimento

FernandoZaupa:
1. Entrevista ao Vivo [Imperdível]
2.“Você quer acabar com a minha vida!”

Ana Merij: Para Arthur, que chegou...

Aquiles Reis: O retrato da alma

Belvedere Bruno: A ruptura dos nós

Pedro Marangoni: Facebook: amizades válidas?

Eliana Crivellari: Colheitas do Silêncio

Jairo Ferreira Machado: Sexo também é Cultura

José Félix: A liturgia dos dias

M. Esther Torinho: Algumas Poesias...

Maria João Oliveira: FORMIGA COM ASAS*

Malu Fontes: NINGUÉM É INOCENTE EM BRASÍLIA

Márcia Sanchez Luz : Canção Noturna

Marcelo Sguassabia: ESTAÇÃO PARADISO

Roberto Kahlmeyer-Mertens: 'Chove nos campos de Cachoeira', de Dalcídio Jurandir

Rudá Rocci: Código Florestal: o espelho do gerenciamento político de Dilma



Para acessar:



Academia Niteroiense de Letras (ANL): Programação para o mês de maio de 2012





Programação para o mês de maio de 2012


Dia 9, às 17h 30min
Posse solene de Geraldo Freitas Caldas na Cadeira 21, patronímica de Silva Santos
Discurso de recepção a serproferido por Márcia Maria de Jesus Pessanha
Auditório Amaury Pereira Muniz
Rua Visconde do Uruguai, 414- Centro


Dia 16, às 17h
Painel da Saudade em louvor àmemória de Edmo Rodrigues Lutterbach
Oradora: Neide Barros Rêgo
Rua Visconde do Uruguai, 456- Centro

Dia 23, às 17h
Eleição para a cadeira 19, patronímica de Azevedo Cruz, vaga pelo falecimento de Milton Nunes Loureiro
Sessão exclusiva para acadêmicostitulares da ANL
Rua Visconde do Uruguai, 456- Centro

Dia 30, às 17h
Projeto “Conversa Literária”
Mediador: Gilson Rangel Rolim
Entrevistado: Carlos José RosaMoreira
Rua Visconde do Uruguai, 456- Centro