quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Edmo Rodrigues Lutterbach - Preito de saudade.




Na tarde do último 27 de setembro, a cultura fluminense sofreu significativo abalo. Morreu Edmo Rodrigues Lutterbach, um dos últimos representantes de uma aristocracia intelectual que – indelevelmente ligado às coisas e gente de nossa terra fluminense – deixa lacuna insuprível. A postagem de hoje é a reprodução (de memória) da breve alocução feita de improviso por mim durante a cerimônia de corpo presente:

Edmo Rodrigues Lutterbach e Roberto Kahlmeyer-Mertens
em julho de 2008


Prezados amigos:

Quando morreu Euclydes da Cunha seu corpo foi velado no Salão Nobre da Academia Brasileira de Letras – ABL e, entre as muitas falas daquela noite, houve a de seu amigo o escritor e também acadêmico Coelho Netto. Destacou-se esta fala por causa da metáfora referente a Euclydes.
Coelho Netto lembrou o quanto, imersos em nossa rotina, passamos indiferentes por aquele grande carvalho à beira da estrada e, apenas quando este é tombado na tempestade da noite anterior, é que nos damos conta do quanto ele era magnânimo. A imagem indica que apenas nos damos conta da grandiosidade dos homens em sua falta, i.e. quando eles se tornam ausentes.
Se cabida naquela ocasião, é preciso dizer que tal fala não se aplicaria no presente momento. Seria porque Edmo Rodrigues Lutterbach não seria um grande homem? Absolutamente! A fala é inadequada, pois Edmo Rodrigues Lutterbach nunca tombou. O presidente da Academia Fluminense de Letras – AFL esteve, até a hora derradeira, firme em seus propósitos, fiel os seus ideais e valores e, sobretudo, no exercício de zelar (ao seu modo) pelos interesses desta honrosa casa. Edmo Rodrigues Lutterbach, como uma árvore forte, feneceu de pé.
Os soluços de agora e a plangente saudade que já nos espera à soleira da porta, indicam que não devo me delongar mais. Entretanto, não poderia terminar sem registrar um pedido à presidência que assume a Academia Fluminense de Letras. Trata-se de um apelo, um encarecido apelo: Que (do mesmo modo que a Academia Brasileira de Letras tem por alcunha “Casa de Machado de Assis” e a nossa queridíssima Academia Niteroiense de Letras também se chama “Casa de Horácio Pacheco”) a Academia Fluminense de Letras, cuja história se mescla sobremaneira à vida de seu eterno presidente, passe a se chamar, doravante, “Casa de Edmo Rodrigues Lutterbach”.

Tenho dito.



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domingo, 25 de setembro de 2011

"Eros & Psyque" - Poema de Fernando Pessoa



    BURNE-JONES, Edward (Sir.). Eros e Psyque. Sheffield Art Gallery,
Sheffield, Reino Unido, 1871. Óleo sobre tela.


Eros e Psique, por Fernando Pessoa

Ao Roberto Santos Almeida


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.


Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.


A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.


Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.


E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,


E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
                        (PESSOA, Fernando. Revista Presença, Coimbra: 1934 n.o 41.)






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