Desta vez, sem palavras introdutórias. Passemos rápido à prosa de Belvedere Bruno. Ela fala por si só:
A medida dos dias,
Belvedere Bruno
Eram dias pesados aqueles. Rabiscar palavras, cortar frases, substituir adjetivos. Fechasse eu os olhos subitamente, para sempre, algo mudaria? Para onde fui, onde escondi meu eu, em que abismos mergulhei , para cair nesse ostracismo?
O telefone toca. Há uma espécie de mimetismo rondando os meus dias - telemarketing, sirenes, buzinas, tragédias anunciadas. Nada de novo. Sequer um cântico que me desperte. É como se, aos poucos, sem querer, me enquadrasse nesse mundinho abjeto, cujo roteiro não permite mudança, mínima que seja. Adapto-me de forma que já não tenho personalidade. Faço parte de cada objeto, situação, e sigo as regras.
Há, aqui, um espelho lateral que me permite observar as inúmeras mudanças ocorridas em meu corpo, à medida que, inconscientemente, fui me desvencilhando de meu eu. Vampirismo ou coisa similar? Sinto vontade de reagir, quebrando-o, mas dizem que quebrar espelho é igual a sete anos de azar. Além disso, ele não mente. Paciência, porém me intriga pensar que esse ser amorfo seja eu.
Bebo um gole de água. Minha boca está seca, tal qual a minha alma. Entrego-me passivamente, quem sabe, por medida de segurança? Levanto-me e, através da janela, vejo o corre-corre das crianças no parquinho, a movimentação do dia a dia, mas tudo isso faz parte do mais antigo dos cenários.
Nada tenho a anunciar. Desconecto-me. Fecho as cortinas e, imersa na escuridão de meu quarto, penso em como essa vida é sem sentido
Belvedere Bruno nasceu em Niterói/RJ, onde reside. Cedo despertou para as letras, graças ao incentivo do pai, que sempre presenteou os filhos com livros. Atualmente, dedica-se às prosas, gênero onde mais se identifica. Tem várias antologias publicadas, como diVersos - Scortecci, @teneu.poesi@ - Scortecci, Com licença da palavra - Scortecci, O Conto Brasileiro hoje - Volumes VIII, Volume X e Volume XII - RG Editores. Tem publicações em diversos jornais da cidade, assim como em outros estados, e mesmo no exterior. Vinho Branco, safra especial de contos e crônicas, seu voo solo, será lançado em maiode 2010.
Belvedere Bruno: Um debut literário regado a Vinho branco
Roberto S. Kahlmeyer-Mertens
A mesa foi posta com ansiosa antecedência, a luz baixa das velas e as rosas vermelhas dão um toque de classe ao ambiente e favorecem a proximidade. A garrafa escolhida a dedo já foi para o balde com gelo, mas a atmosfera só se instaurará depois de um brinde. Quem levanta a taça desta vez é Belvedere Bruno, escritora que com Vinho branco, safra especial de contos e crônicas (Livro pronto, 2010) estreia em nossa cena literária.
A obra – cuja principal virtude é a heterogeneidade – traz contos e crônicas em uma disposição artesanal de temas que compõe um cenário repleto de graça (de modo a lembrar copos de cristal com decoração variada numa mesma bandeja). A simplicidade, que faz do livro um trabalho muito verdadeiro e sincero, não prescindiu ali da ousadia. Nossa novel-escritora abre o livro de uma maneira inusitada, causando um impacto estético que precisa ser conferido, mas, sobre isso, a única pista que daremos é a indicação de que a autora sabe que certa dose de suspense (à Poe) bem pode amplificar o deleite da leitura por vir.
Um alerta: não se deixem seduzir pelos títulos, muitos deles são pistas falsas, e onde se espera “Uma mulher, infinitas escolhas”, será possível encontrar a crueza do confronto entre a fealdade humana e a esperança que a vida teima em cultivar; quem vai à procura da prosa intimista e sensualista prometida em “Beleza e sedução” e “Vinho branco” (que nomeia e justifica o título do livro) talvez se depare com uma reflexão existencial, mais sentida do que teorizada; por outro lado, quem julga dever evitar uma crônica com o título embaraçante de “A bengala”, pode estar perdendo a singela ficção que retrata o cotidiano de mãe e filha. No mais, afetos tempestuosos se ocultam por trás de títulos como “O homem e as flores” e “Metamorfose”. Deste último, registremos aqui uma pequena prévia (uma isca, se assim quiserem): “Aquele silêncio, só quebrado em situações especiais, trazia, enfim, a convicção de que se relacionava com um monólogo. Sabia sobre a existência de silêncios enriquecedores, com mais significados que palavras, porém não era o caso. Procurara avidamente motivações que a convencessem a continuar protagonista naquele enredo”. Apesar das indiscrições feitas aqui, por mim, as 119 páginas de prosa que integram o livro ainda constituem inesgotável reserva de surpresas ao leitor.
É uma festa o livro que a autora nos preparou. Nele há o espaço para o flerte sutil com a linguagem, e experiências estéticas que espocam de cada página como fogos de artifício em um parque!
Influências?! Só de longe... em traços não muito nítidos: Artur da Távola ou seria Fernando Sabino? Dalton Trevisan?... Difícil precisar. Há ali um estilo próprio em formação que deverá se consolidar nas próximas obras que certamente virão.
– Belles Lettres, Belvedere! – No sorriso franco de seu livro, mais que um convite, uma promessa literária.
Roberto, gratíssima pela sua generosidade. Como é bom ter pessoas como você, que tanto estimulam nossa cultura.
ResponderExcluirUm abraço com carinho
Belvedere
Parabéns Bel. Você é uma colecionadora de títulos. Bem merecidos, porque nada vem sem o trabalho e dedicação que você tem demonstrado com o seu trabalho bem elaborado.
ResponderExcluirUm abraço do seu mordomo,
Benny Queiroz
Pelo nível que seu blog tem, pela qualidade de suas postagens (essa da Belvedere Bruno, por exemplo) e pelo trabalho que vc presta pela nossa cultura, parabéns.!!!
ResponderExcluirCaro Roberto,
ResponderExcluirDiante de seu bom gosto e espírito refinado. Não nos resta muita opção senão aquiescer a indicação.
Gostei muito do texto da Belvedere. Ela deve ter ficado feliz com a indicação em Blog tão respeitado.
Durante a semana, vou ver se encontro o livro dela para comprar.
Abraços do
Marquinhos
Depois de postagens sobre Sávio Soares de Sousa, Luís Antônio Pimentel, Wanderley Francisconi, Belvedere Bruno deve estar feliz em ver seu trabalho alinhado ao do desses mestres.
ResponderExcluirFui no link que nos liga ao site dela. Apreciei a qualidade da escrita literária da autora.
Muito boa!!!
Vou acompanhá-la de perto, agora.
Kahlmeyer, Kahlmeyer... tens todo meu apoio em sua trajetória literária.
Abraços
Marco
revelação é vc kahlmeyer!
ResponderExcluirsucesso para vc e para todos que crescem junto contigo.
Palmirinha.
Roberto amigo,
ResponderExcluirdiante da nova safra de embusteiros, mandriões e pilantras que gravitam na dita "vida inteligente de Niterói", é bom recebem notícias de gente jovem e talentosa fazendo a diferença.
Eu já estava me desesperando.
Emanuel
Gosto deste blog. Continue me atualizando dos novos posts.
ResponderExcluirÉ sempre um prazer ler Belvedere Bruno; e fico sempre muito contente em vê-la brilhar pelos caminhos da Literatura.
ResponderExcluirParabéns ao blogue pela postagem e à Bel.
Um beijo,
Cissa de Oliveira
Oie Prof!
ResponderExcluirO livro da Belvedere Bruno deve ser um must!
Onde conseguir um exemplar?
Fik dik
:)
Amigos, grata pelos amáveis comenários. Meu livro é muito simples, mas podem adquirir aqui na Guttenberg, Moreira César. Como fiz uma edição pequena, estão acabando.
ResponderExcluirBjs
Belvedere
Vlw Belvedere,
ResponderExcluirvoh Comprah.
o o aueh ae o!
;)
Caro Roberto,
ResponderExcluirsão sempre muito reveladoras as postagens de seu BLOG. Se a sua resenha disser mesmo a verdade (se o livro da Belvedere for tudo que a resenha diz) então, temos, de fato, um novo valor nas letras de nossa cidade (vou procurar o livro dela em Niterói).
Sou obrigada a concordar com Emanuel na postagem acima, embora eu não queira ser tão agressiva assim. Niterói precisa cultivar seus novos talentos.
Jornais, revistas, rádios, canais de tv independentes, instituições literárias tem que dar força a quem está crescendo, isso é dever!
Belvedere Bruno merece seu apoio, vc precisa ser tb apoiado nas boas e muito boas coisas que vem fazendo.
Meu apoio, como pode ver, vc já tem.
Parabéns por este BLOG tão cultural,
Abraços,
Sônia Lobo
Excelente,pela pureza do conteudo, pela simplicidade em descrever mágoas talvez profundas, por sua doação que nos permite identificar-nos com alguns aspectos de sua personalidade.
ResponderExcluirOBRIGADA
NICOLETA
Que prosa dorida e bela!
ResponderExcluirDeve ser isso o que chamam de angústia existencial!
Só quem é dotado de uma alma refinada sabe o que é isso.
Obrigado Belvedere!
Ass:
Estrela Leandros
Ler Belvedere é se embebedar de palavras doces e saborosas, é ter o calor das imagens poéticas aquecendo o coração. Parabéns Bel, parabéns ao blog por ter entre os seus essa escritora formidável. Pastorelli
ResponderExcluirBelvedere é um alento para todos aqueles que gostam de uma boa prosa, além do mais é uma poeta de altíssima qualidade, oque o BLOG poderia explorar oportunamente.
ResponderExcluirNaldo Velho
... e eu gostei!
ResponderExcluirEu todas as vezes que leio um texto da Belvedere faz me lembrar do medo da morte que tenho. Mas o que é pior a morte ou uma vida sem sentido? Considero a vida humana um presente, não devemos jogar fora, pode ser única. Por isto temos de valorizá-la.
ResponderExcluirBelvedere tem todos os motivos para estar feliz. Ter seu livro e seu talento reconhecidos em um blog do calibre de Literatura Vivência tem um valor inestimável. Não falo de fama, mas de reconhecimento. Publicar um livro não é difícil nos dias de hoje, mas apenas publicar um livro não faz de ninguém um escritor. Belvedere, estreante, está sendo reconhecida como talento verdadeiro, porque é o que realmente ela é.
ResponderExcluirLi os comentários e não digo que fiquei surpresa porque há tempos conheço o talento de Belvedere como sua revisora. Porém, fiquei maravilhada por ela estar sendo colocada em tão alto conceito em pouco tempo. Fiquei feliz por Belvedere, feliz por nossa parceria, feliz em constatar que a boa literatura ainda é reconhecida, a despeito de tantas pseudo-obras que grassam por aí. Parabèns, Belvedere! E que venha logo o segundo livro, para deleite dos seus leitores.
Blog dos melhores, que vem suprir certa carência que Niterói e adjacências têm de uma séria, saudável e criativa informação literária que coincide com meu ideal não só de informação em si, mas principalmente de transformação e formação de escritores poetas, contistas, cronistas, ensaístas e críticos. Gente que se encontra em estado embrionário, nas esquinas da Ararigboia, necessitando de um fôlego de modernidade cultural que observo neste Blog: ar puro, sem mofo, sem ácaros acadêmicos
ResponderExcluir(academicistas, melhor dizendo) nem recorrências modernosas. Contracorrente, o que me agrada. Como também me agrada, e muito, a densa prosa/poesia de minha amiga Belvedere.
Ricardo Augusto dos Anjos
Bel,
ResponderExcluirMais que merecido o destaque dado as suas letras.
Parabéns!
Abs, anamerij
Bel, seus textos são sempre cheios de mistério, mesmo os mais subjetivos. Ter o reconhecimento do público é consequência das suas letras perfeitas. Parabéns por figurar nesse belo espaço. Amo todos os seus escritos. Beijosssssss
ResponderExcluirConheci os textos de Belvedere Bruno há alguns anos, quando a mesma escrevia no Jornal Lig. Mais tarde , passou a escrever no Jornal Santa Rosa. Seus escritos me conquistaram por sua leveza, concisão e realismo. É muito bom ter um nome como Belvedere Bruno em nossa cidade.
ResponderExcluirParabéns, Roberto.
Rosa Lemos - Ingá
Olá, Bel, sempre fui apreciadora dos seus textos, pois são bjetivos e nos levam a reflexão. Você traduz seu pensamento, misturando à realidade com muita perfeição.
ResponderExcluirDeixo meu abraço amigo e a honra de poder tê-la como amiga e escritora brasileira a abrilhantar o cenário das letras.
Estou aqui em Portugal, num auto-exílio necessário ao meu aprimoramento, mas semnpre atenta ao Brasil e aos seus artistas.
Bjks. e felicidades!
MEG KLOPPER
Porque a sensibilidade é um dom, vale a pena ler e saborear os teus poemas. Baixei seu ebook O Tempo Voa, quero ler com calma, porque já sei que vou me encantar. Bjão amada.
ResponderExcluirConheço, há vários anos, a escrita concisa de Belvedere Bruno. Ela sempre conseguiu expressar as suas ideias e comunicar o essencial em textos curtos, densos, incisivos, que mergulham, por vezes, em questões de ressonância universal, como acontece, por exemplo, no conto "A Medida dos Dias", um texto onde a vida é destronada e substituída pelo vazio. Um vazio que levanta a questão do sentido da vida. E a pergunta pelo sentido é inevitável, até porque o Homem é constitutivamente pergunta. Em última análise, pergunta por si mesmo: "Quem sou? Porque estou aqui? Qual o sentido da minha vida? O que é que habita no seu núcleo? E revoltamo-nos contra a perspectiva do naufrágio no nada.
ResponderExcluirTambém por isso, a personagem-narradora deste conto, perante o espelho, sente "vontade de reagir, quebrando-o". O Tempo é implacável e as mudanças que ela observa no seu corpo provocam-
-lhe uma insuperável crise de identidade. Afunda-se num desespero niilista que não lhe permite lutar contra o Minotauro que a devora. E acaba por cair numa ruptura consigo própria, com os outros e com o mundo (" ... Nada tenho a anunciar. Desconecto-me. Fecho as cortinas e, imersa na escuridão de meu quarto, penso em como essa vida é sem sentido...").
Na verdade, sem a vivência do sentido, a vida humana é intolerável e a indiferença suga-a até à exaustão.
Parabéns, Bel, pelo conto "A Medida dos Dias"! Um conto que faz pensar o leitor.
Felicito também o Autor deste belíssimo blog, pelo incentivo e visibilidade que dá aos escritores de Niterói. Uma visibilidade que derrama também a sua luz sobre quem a dá.
Um abraço para ambos
Maria João Oliveira - Portugal
Prezada Belvedere, sobre os sabores de suas crônicas, já os disse a você por escrito e pessoalmente. Expressão de vida verdadeira... muitas reflexões. Uma constatação: não estamos sozinhos. Só que, desta vez, com perfume de vinho servido em taça transparente. Parabéns! Liane
ResponderExcluirJá li algumas e apreciei muito. Há um ano recebi um exemplar de "Vinho branco", da niteroiense Belvedere Bruno, cujas crônicas tocam o coração e trazem a alegria de viver. Cumprimento-lhes pelo blog Literatura-Vivência,que recomendei aos amigos de Mato Grosso do Sul, do DF e do Norte Brasileiro.
ResponderExcluirParabéns Bel !! Um orgulho pra família ! Do seu sobrinho Felipe, direto de Svalbard, no polo norte, última cidade ao norte do Planeta !!
ResponderExcluirQue satisfação, LIpe! Adorei! Mil bjs e volte sempre ao blog!
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