Em 5 de agosto de 2011, tivemos uma noite extra-ordinária e, por isso mesmo, digna de documentário. Tratou-se da entrega da Medalha João Baptista Petersen, outorgada postumamente a Ayrton Pinto Ribeiro, pela Câmara Municipal de Niterói.
Intelectual de valor reconhecido nos círculos acadêmicos da cidade, Ayrton Pinto Ribeiro teve sua memória merecidamente lembrada na noite de hoje pelos seus pares e, principalmente, pelos representantes do Poder Legislativo de Niterói (representados na pessoa do vereador Vitor Júnior).
Pelos motivos apresentados acima, a presente postagem não apenas registra o extremo contentamento dos familiares e amigos do agraciado, quanto também a satisfação de toda a comunidade intelectual em saber que a Câmara Municipal de Niterói reconhece e incentiva os produtores de cultura em nossa cidade. Atitude que – além de muito agradar à sociedade niteroiense – torna claro os valores altivos cultivados naquela Casa.
Entre as muitas falas efetuadas durante a cerimônia, Literatura-Vivência publica – na íntegra – o emocionado discurso de saudação proferido por Wanderlino Teixeira Leite Netto, na solenidade de entrega da honraria, além de algumas fotos colhidas in loco.
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Discurso de saudação a Ayrton Pinto Ribeiro, agraciado in memoriam com a Medalha João Baptista Petersen. (1)
Ilmo vereador Vitor Júnior,
prezados familiares de Ayrton Pinto Ribeiro,
senhoras Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos,
Lia Bueno Ribeiro de Carvalho Gama,
senhor Jarbas Pinto Ribeiro,
demais integrantes da mesa,
outros vereadores e parentes do homenageado porventura aqui presentes,
senhoras, senhores.
Parabenizo o vereador Vitor Júnior por haver removido o véu da deslembrança e nos reunido neste plenário Brígido Tinoco para esta homenagem à memória de Ayrton Pinto Ribeiro.
Agradeço à senhora Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos pelo honroso convite para que eu ocupasse esta tribuna. Espero corresponder à confiança em mim depositada.
Residindo no exterior faz algum tempo, é possível que Eliana se tenha espantado com o fato de que os contemporâneos de seu pai, dos quais se lembrou, só poderiam saudá-lo por meio de afagos com mãos de nuvem, exceto o queridíssimo e longevo Luís Antônio Pimentel, prestes a comemorar seu centenário de nascimento.
Devo confessar-lhes que nunca havia sequer falado com Eliana até uma semana atrás, mas já lhe reservo afeto de antiga amizade, semelhante àquela que seu pai e eu cultivávamos. Justifica-se assim o tratamento coloquial que passei a lhe dedicar neste pronunciamento já a partir do terceiro parágrafo.
Devo confessar-lhes que nunca havia sequer falado com Eliana até uma semana atrás, mas já lhe reservo afeto de antiga amizade, semelhante àquela que seu pai e eu cultivávamos. Justifica-se assim o tratamento coloquial que passei a lhe dedicar neste pronunciamento já a partir do terceiro parágrafo.
Ayrton Pinto Ribeiro aceitou o grande desafio em 8 de dezembro de 1911. No dia 9 de fevereiro de 1995 dormiu o sono de não acordar. Eu poderia mencionar outros dados biográficos. Diria, por exemplo, que Ayrton Pinto Ribeiro foi um dos fundadores do Grupo Mônaco de Cultura. Também diria que ele integrou os quadros da Academia Fluminense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Niterói. Segundo o historiador Salvador Mata e Silva, Ayrton foi o mais eficiente de todos os secretários que já passaram pelo Instituto. Poderia, ainda, destacar sua carreira profissional. Que se aposentou como escrivão de Polícia, eu poderia dizer. Poderia falar que Ayrton Pinto Ribeiro escreveu para jornais em Niterói, que deixou livros por publicar. Poderia referir-me ao excelente pesquisador da História de Niterói e do antigo Estado do Rio de Janeiro. Poderia, enfim, dissecar sua biografia.
Porém darei ênfase ao admirável ser humano que brindou a todos que com ele conviveram com sua amizade, que lhes transmitiu lições de compreensão e de tolerância, de valorização do simples, de desapego à vaidade. Ayrton Pinto Ribeiro foi um arauto da salutar convivência. Foi este Ayrton que me veio à mente tão logo recebi o convite de sua filha Eliana para saudá-lo in memoriam nesta oportunidade.
A medalha que hoje se confere a Ayrton Pinto Ribeiro, em homenagem póstuma, leva o nome de João Baptista Petersen, um dos mais atuantes vereadores entre todos os que já passaram por esta Câmara Municipal, tão prematuramente falecido.
A cerimônia desta noite vem envolta no papel celofane da saudade, sentimento dúbio: se por um lado fustiga, por outro afaga. Nesta solenidade, mais afaga do que fustiga. Afinal, realiza-se em louvor à memória de quem sempre fez da delicadeza sua marca registrada. Ayrton Pinto Ribeiro era um homem afável, bom ouvinte, conselheiro cuidadoso.
Por volta de 1966, temerosos do que lhes pudesse acontecer por conta da repressão aos opositores do regime que se instaurara no País pelo golpe militar de 31 de março de 1964, um grupo de amigos passou a se reunir, de segunda a sexta-feira, no Centro da cidade de Niterói, mais precisamente em frente à Galeria Gold Star, na Rua da Conceição. Assim se faziam visíveis. Qualquer sumiço tornar-se-ia evidente. Luís Antônio Pimentel, Hugo Tavares, Ney Costa, Ambrósio Godofredo de Campos Góes e Ayrton Pinto Ribeiro, entre outros, participavam desses encontros. Espirituosamente, declaravam haver fundado a “Universidade do Calçadão”. Em 1986, o grupo ainda se reunia, não mais para se proteger, mas para entabolar animadas conversas. A maioria delas, para justificar a denominação do ponto de encontro, versava sobre literatura. À medida que a redemocratização do País ganhava corpo, novos “universitários” iam surgindo na universidade sem paredes. Alguns se tornavam assíduos, outros por lá apareciam com menor frequência. Gradativamente, por conta da “Indesejada das gentes”, à qual aludiu Manuel Bandeira, as presenças dos precursores foram diminuindo até que aquela universidade ao ar livre cerrou as portas que não possuía.
Foi lá, em frente à Gold Star, que Angelo Longo, também saudoso e querido amigo, me apresentou a Ayrton Pinto Ribeiro. Envolvido com meu trabalho na PETROBRAS, ainda assim me esforçava para comparecer a esses encontros. À época já quarentão, porém quase um menino comparativamente à maioria dos “universitários”, absorvia avidamente as sábias palavras dos mestres, entre os quais o homenageado desta noite.
Minha relação de amizade com Ayrton extrapolou as fronteiras da “Universidade do Calçadão”. Quanto mais se estreitava, mais eu percebia a nobreza de seus sentimentos, de suas atitudes, mais ele se mostrava para mim um semeador de afetos.
Tenho até hoje recortes de O Fluminense, que me eram trazidos por Ayrton no ano de 1990, tempo em que o jornal publicava uma coluna intitulada “Recordando”, por meio da qual abordava partidas de futebol realizadas na década de 1960, quando em Niterói havia estádios e campeonatos do popular esporte. Sabedor de que eu integrara algumas das equipes daquele tempo, Ayrton selecionava os recortes que faziam referência a meu nome e os entregava para mim com o mais afável dos sorrisos.
Faz poucos dias, enquanto alinhavava este pronunciamento, fiz uma descoberta: o autor da coluna, que não vinha assinada, era o próprio Ayrton. Ele a publicara no jornal A Tribuna de 1964 a 1975; em 1990, aí então em O Fluminense, voltara a fazê-lo. Pelo fato de haver exercido o cargo de secretário da Federação Fluminense de Desportos, tinha acesso aos arquivos, nos quais garimpava matéria para a coluna. Entre os meses de maio e outubro de 1990, foram publicados cinco registros envolvendo partidas das quais participei, não apenas em clubes, também na seleção juvenil do antigo Estado do Rio de Janeiro. Sem dúvida, mais um afago do bom Ayrton. Discreto como sempre, lambuzou-me de mel o ego, mas não me revelou ser ele próprio o apicultor.
Pronto para o prelo, A história do futebol em Niterói, significativa contribuição para preservar a memória da cidade, foi um dos livros não publicados por Ayrton Pinto Ribeiro. Sugiro aos familiares que procurem a Niterói Livros, editora vinculada à Fundação de Arte de Niterói, órgão integrante da estrutura organizacional da Prefeitura, cuja finalidade vem a ser a de editar livros alusivos ao município.
Foi este Ayrton Pinto Ribeiro, sempre afetuoso, sempre cordial, sempre generoso, que eu quis relembrar neste meu pronunciamento.
Vou me valer dos últimos versos de “Todo sentimento”, composição de Chico Buarque de Holanda e Cristóvão Bastos para encerrar minha fala. Trata-se de uma canção de amor, mas creio que os versos se prestam também para celebrar a amizade. Dizem assim:
“Depois de te perder
te encontro, com certeza,
talvez num tempo da delicadeza,
onde não diremos nada.
Nada aconteceu.
Apenas seguirei
como encantado ao lado teu”.
Muito obrigado!
NOTA:
1. Texto gentil e exclusivamente cedido por seu autor ao Blog Literatura-Vivência.
Cobertura fotográfica do evento de outorga da Medalha João Baptista Petersen
Ayrton Pinto Ribeiro (in memoriam)
1911-1995
Mesa diretora. Da esquerda para a direita para a esquerda: Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos,
Dalma Nascimento, o vereador Vitor Júnior, Godofredo Pinto e Eneida Fortuna.
Dalma Nascimento, o vereador Vitor Júnior, Godofredo Pinto e Eneida Fortuna.
Mesa diretora (visão ampla): Da esquerda para a direita para a esquerda:
Wanderlino Teixeira Leite Netto, Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos,
Dalma Nascimento, o vereador Vitor Júnior, Godofredo Pinto e Eneida Fortuna.
Novo ângulo da mesa diretora. Em primeiro plano, a acadêmica (AFL) Eneida Fortuna,
ao seu lado o professor e ex-prefeito de Niterói Godofredo Pinto e o vereador Vitor Júnior.
Ângulo oposto da mesa diretora. Wanderlino Teixaira Leite Netto
(levantando para pronunciar seu discurso na tribuna),
Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos (filha de Ayrton Pinto Ribeiro),
a professora Dalma Nascimento e o vereador Vitor Júnior.
O acadêmico Wanderlino Teixeira Leite Netto lendo seu discurso de saudação.
A jovem neta de Ayrton Pinto Ribeiro, representando os netos e bisnetos
do agraciado com a Medalha
Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos (filha de Ayrton Pinto Ribeiro)
em sua alocução de agradecimento
Membros integrantes da mesa ouvem emocionados o pronunciamento
de Eliana Bueno Ribeiro Vianna Santos
Vista geral da audiência no Plenário Brigido Tinoco
Netos e bisnetos de Ayrton Pinto Ribeiro recebem a Medalha das mãos da viúva do patrono João Baptista Petersen e o diploma do vereador Vitor Júnior
O congraçamento de Wanderlino, Eneida, Eliane e Dalma ao fim da cerimônia
Alguns dos ilustres convidados da família de Ayrton:
o filólogo Maximiano de Carvalho e Silva e a atriz Imara Reis.
Os Professores Roberto Kahlmeyer-Mertens e Maximiano de Carvalho e Silva
Wanderlino Teixeira Leite Netto e sua companheira, a poetisa Lena Jesus Ponte