Nem só de nativos a literatura fluminense se engendra. É também – e principalmente – com os filhos “agregados” que esta cultura se faz. Neste caso, todos os que, por amor, se chegam ao nosso estado para compor o corifeu de nossa literatura são filhos (filhos tão legítimos quanto os nascidos no estado do Rio de Janeiro). Trata-se de uma legitimidade de mão dupla, pois, além de adotados, são também “adotantes”, isto é: elegeram de bom grado nosso espaço espiritual para fazer sua arte. A criação, um lócus, o amor eletivo. Legitimamente eletivo (!)
Bem como Geir Campos, outro nome que se adequa ao caso acima é o de Renato Augusto Farias de Carvalho. Conheçamos, pois, um pouco de sua arte, antes de conhecer sua persona:
Vida
para Beatriz Chacon
Eu nunca soube dizer
da excêntrica fantasia
cegueira e guia
das minhas proezas
caras envergonhadas,
destino calado onde entrouxei
o homem dissimulado.
Pré-venerável
cerro fantasias
alegrias perdidas.
Vida, vem como dantes
vem, e não me tragas feridas.
Nós
deitei sem respirar
no travesseiro de afetos
da tua barriga branca
solfejo errado
teclado prateado
estranho canto pálido
na inconstante cama
iluminada quina de amor
para dois namorados que “fotografei”
na mente numa velha ponte do Praga
da excêntrica fantasia
cegueira e guia
das minhas proezas
caras envergonhadas,
destino calado onde entrouxei
o homem dissimulado.
Pré-venerável
cerro fantasias
alegrias perdidas.
Vida, vem como dantes
vem, e não me tragas feridas.
Nós
deitei sem respirar
no travesseiro de afetos
da tua barriga branca
solfejo errado
teclado prateado
estranho canto pálido
na inconstante cama
iluminada quina de amor
para dois namorados que “fotografei”
na mente numa velha ponte do Praga
(CARVALHO, Renato Augusto Farias de. Eu ainda não disse tudo. Manaus: Valer, 2011).
Renato Augusto Farias de Carvalho nasceu em Manaus/AM no dia 30 de junho de 1935. Em sua terra natal, estudou no Colégio Salesiano Dom Bosco. Na cidade do Rio de Janeiro/RJ, para onde se mudou em janeiro de 1952, continuou seus estudos no Colégio Andrews, tendo participado do Grêmio Acadêmico, que ajudou a fundar. No início de 1978, passou a residir em Niterói/RJ. Graduou-se em Letras (Língua e Literatura – Português/Francês) na então Faculdade de Humanidades Pedro II (FAHUPE). Pós-graduou-se em Administração Pública na Fundação Getúlio Vargas. Exerceu diversas funções e cargos na Previdência Social (Direção Geral – RJ), aposentado-se em 1989. Ocupante da cadeira nº 6 da Academia Niteroiense de Letras, também é membro do Cenáculo Fluminense de História e Letras e da Associação Niteroiense de Escritores. Publicou os seguintes livros: Porto de Ocasos (ficção/memórias. 1998. Editora Cromos), Poesia-do-que-eu-quis (poemas. 2002. Editora Cromos) e Vinho e Verso (poemas. 2005. Ed. Valer). Entre as diversas medalhas já recebidas, destacam-se a José Cândido de Carvalho (conferida pela Câmara Municipal de Niterói) e a do Mérito Cultural Belas Artes (conferida pala Associação Fluminense de Belas Artes). Participou, como entrevistado, do projeto “Personalidades de Niterói”, iniciativa da Associação Atlética do Banco do Brasil – AABB/Niterói. Autor dos enredos carnavalescos “Jorge Amado – do País do Carnaval à Tieta do Agreste” (1978) e “E agora malandro? – Você ganhou a loteria!” (1979), desenvolvidos para Escolas de Samba de Niterói, e de monografia sobre o Clube da Madrugada (movimento cultural de escritores amazonenses nos anos 1950). Das muitas palestras proferidas, destacam-se: “Teatros do Brasil” (participação de Beatriz Chacon e Thuany Feu de Carvalho), “Fagundes Varela”, “Cora Coralina e Manoel de Barros (participação de Gracinda Rosa e Lena Jesus Ponte), “Xavier Placer, 50 anos de literatura”, “Adelino Magalhães, e o pré-modernismo”, “Cora Coralina e Florbela Espanca, um encontro tão possível”, “Articulação poética aproximando Luiz Barcellar e Jorge Tufic” e “Lindalva Cruz e suas composições amazônicas”. É autor de contos e crônicas publicados em jornais e revistas e de alguns prefácios. Possui textos em antologias.
Poh Roberto!
ResponderExcluirOlha soh a poesia q vc nos apresenta!
Que coisa bela e sensual!!!
E a trilha sonora de Brel, ao fim!
Seu Blog é algo mais!
Excelentes conteúdos, requinte e erudição.
Vc eh o cara!
Mande um abraço para o Renato e diga que ele tem um fan daqui para frente!
Aderaldo.
Vanelois Pfeil
ResponderExcluirdepois de uma homenagem como essa a música do final “Voir um ami pleurer” (Ver um amigo chorar) não procede mais! A menos que este chorar seja de emoção!...
Parabéns pelo seu generoso, significativo e inestimável trabalho em nome da literatura. Sabemos apreciar este valour.
Au revoir!
Pfeil
Grande Roberto! Grande Renato! Terna e maravilhosa Beatriz Chacon. Grata pelo presente!
ResponderExcluirBelvedere
Eu gostei!
ResponderExcluirRenato é poeta sensível no papel e na vida. Sabe semear palavras e amizades. Bela homenagem a ele, Roberto.
ResponderExcluirParabéns pelo blog. Abraço fraterno.
Lena
Literatura-vivência vem se tornando um espaço de referência para a cultura letrada de Niterói.
ResponderExcluirNão há como não se sentir lisonjeado com uma postagem neste blog.
Mais que a homenagem, há a divulgação de trabalhos de gente que realmente mecerem destaque.
Tremam e chorem aqueles que não constarem aqui!
De um admirador de seu trabalho,
Ruy
Encontros e reencontros...
ResponderExcluirNa Távola do Professor Roberto Kahlmeyer-Mertens o prazer, sempre renovado, do encontro. Livros, palavras... ciranda do mundo dos homens atravessando oceanos, unindo continentes, ratificando aqui e acolá, sentimentos, reflexões. Sejam literalmente ditos no verso ou na prosa, com a expressão mais genuinamente humana ou sejam ditos no pensamento elaborado do criador, naturalmente ávido por ultrapassar as próprias fronteiras. Obrigada e parabéns mestre Kahlmeyer.
En hora buena reencontramos o poeta Renato Augusto, desejando que augusto sejas, sempre, no teu dizer generoso com a vida, com o mundo de tudo e de todos que te rodeiam. A criação artística não te deixa dormir – lícito. É tua herança – bendita! É sangue que te corre nas veias.
Venho lendo teus textos desde “Porto de Ocasos” e a poesia se faz presente não só em teus poemas. Ela está na crônica, na prosa, na criação do roteiro memorialista de tuas vivências, no teu sorriso largo de bem com a vida. “Eu ainda não disse tudo,” é um título desafiador e corajoso, muito bom! Livro inspirador desde a abertura com o pensamento de Walmir Ayala, à sensibilidade poética dos versos pinçados por Zemaria Pinto na Apresentação, quando escreve: “Renato Augusto Farias de Carvalho ainda tem muito a dizer, sim – ...” “O tempo é uma experiência individual...”
Beatriz Escorcio Chacon, Poeta, em sua obra de arte Carta de Argila, diz: E quando teu dizer se quiser mais um tanto, bem-vindo! Amém!
Renato, cada poema, cada verso lido neste teu relicário de emoções amadurecidas, fruto doce e perfumado de amor, suscita-me escrever uma página à parte. Um mundo de pensamentos meus e dos meus lidos, povoam minhas reflexões e arrebatam-me os sentidos, quase choro.
Veio-me, à lembrança, dentre tantos, um pensamento de Rainer Maria Rilke sobre o qual gosto bastante de me por a refletir: “É difícil viver neste mundo porque há pouco amor entre a Natureza e o Homem e entre o Homem e Deus”. O amor ao teu Amazonas (nosso Brasil), tantas vezes homenageado em tua obra literária, encontra-se em “Eu ainda não disse tudo”, além dos poemas, no verde das matas e no belo pássaro Sturnella Militares, conhecido como Polícia Inglesa dentre as aves da Amazônia, que ornamentam a capa, numa expressão de reverência a Deus. E citando o inspirado Tenório Telles: “em Renato Farias a poesia é um ato de redenção. Também de salvação!”
Os poetas tem o dom de retratar, de dar forma aos sentimentos, às emoções... e este fazer é catarse, salvação que chega até nós.
Augusto sejas, Renato Augusto!
Segue, desde Cascais - Portugal, terra que também amas.
Abraço fraterno da madrinha Cenaculista.
Liane Arêas